O que é a tributação de multinacionais proposta pelo governo e como impacta o Brasil?

O que é a tributação de multinacionais proposta pelo governo e como impacta o Brasil?

A taxação de empresas multinacionais, proposta pelo governo em medida provisória (MP) publicada na quinta-feira (3), não é uma novidade no Brasil.

Na verdade, ela busca adequar a legislação brasileira a parâmetros propostos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), cujo pilar 2 defende que os países apliquem uma taxa mínima de imposto de renda para as grandes empresas que estejam presentes neles.

Muitas vezes, quando se se fala em um reajuste ou tributo novo, há uma rejeição por parte de agentes econômicos que criticam aumentos da carga tributária. Nesta sexta-feira (4), por exemplo, empresários criticaram a medida apontando que ela promove uma “concorrência desleal” no mercado.

O advogado tributarista Leonardo Aguirra, sócio do escritório Andrade Maia Advogados, pontua que a crítica não é adequada, tendo em vista que o que não for cobrado no Brasil, será eventualmente taxado em outro país. 

“O Brasil se manifestou, por meio da MP, que quer um ‘pedaço desse bolo’, que não quer perder arrecadação. Na lógica do pilar 2, os países em que as multinacionais brasileiras estão alocadas vão cobrar se o Brasil não cobrar. Então, não me parece correto falar em aumento, porque isso já aconteceu em outros lugares”, argumenta.

No caso do Brasil, a cobrança de 15%, por meio de adicional da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), será aplicada a multinacionais que tiverem receitas anuais de 750 milhões de euros ou mais em pelo menos dois dos quatro anos fiscais imediatamente anteriores ao analisado.

De acordo com a OCDE, 36 países já aplicam taxações – como Japão, Canadá, Reino Unido e Alemanha -, enquanto outras dezenas ainda pretendem ou comentaram sobre a possibilidade – como Austrália e Estados Unidos – de ficar em concordância com as Regras Globais Contra a Erosão da Base Tributária (Regras GloBE) elaboradas pelo Quadro Inclusivo coordenado pela organização e o G20.

A erosão da base tributária e a transferência de lucros são fenômenos que ocorrem quando as multinacionais buscam mecanismos nos diversos países em que estão presentes para driblar encargos tributários.

A expectativa é de que o volume global de lucros sub tributados seja reduzido em 80%, de 36% para 7%, de acordo com a OCDE.

“O Brasil, embora não seja membro da OCDE, já fazia parte do alinhamento de uma politica de taxação contra a erosão de base e transferência de lucros. Agora, busca se alinhar com o pilar 2, e não está isolado nisso”, afirma Aguirra.

Como impacta o Brasil?

Apesar de ser apontada por alguns agentes econômicos como uma medida desleal, o tributarista explica que a proposta deve mitigar uma deslealdade entre os países.

Aguirra explica que sem o alinhamento internacional, algumas nações buscam dar maiores incentivos fiscais a fim de atrair empresas para investirem nelas, numa espécie de guerra fiscal.

“Essa competição precisava ser mitigada. E com as regras se coloca que abaixo dos 15% de tributação não é mais permitido competir, acima sim”, afirma.

E com a existência dessa coordenação, se o Brasil não fizer parte, o advogado reforça que o país apenas estaria renunciando a recursos que seriam usufruídos por outros.

“O objetivo principal é não ficar para trás nesse alinhamento global de taxar as multinacionais.”

Outro movimento por parte do atual governo que tem sido muito criticado é a busca por equilibrar as contas públicas ampliando a arrecadação. Mas Aguirra reitera que, nesse caso, o objetivo da MP é mais defensivo, a fim adequar o país a um padrão internacional.

Isso porque a vigência da cobrança se iniciará apenas em 2026, já que precisa tomar um ano fiscal cheio como referência, e considerando que a arrecadação deve atingir cerca de R$ 8 bilhões anuais a partir de 2029, quando houver estabilidade.

Assim, ele argumenta que não é uma medida nem imediata e nem em tão grande escala.

E como impacta as empresas?

Questionado se a medida poderia afastar investimentos do país, Aguirra argumenta que não, uma vez que os países que competem com o Brasil também aplicam ou pretendem aplicar esse tipo de taxação; e que na realidade pode ser atrativo para alguns tipos de negócios.

“Talvez tenha uma mudança do perfil de quem investe. Tem um ‘pulo do gato’ dentro dos critérios, há uma exclusão parcial dos investimentos baseados em folha de pagamentos e ativos tangíveis. Por tanto, indústrias mais tradicionais, que têm folha de pagamento elevada ou muitos ativos como maquinário pesado são beneficiadas”, explica o tributarista.

Por outro lado, o advogado relembra que o país ainda tem uma série de benefícios fiscais que podem perder sua eficiência com a taxação de 15%.

“Todos são baseados na redução de Imposto de Renda para as empresas, de modo que esses benefícios tendem a perder eficiência com o adicional de CSLL. A gente tira com uma mão e cobra com a outra”, pontua Aguirra.

O advogado sugere que as empresas que se enquadrem na tributação realizem um recálculo de encargos tributários para averiguar o impacto desse cenário. De acordo a Receita Federal, 290 multinacionais devem ser taxadas, sendo 20 delas de origem brasileira.

Aguirra chama atenção para os seguintes benefícios:

  • Incentivos ligados à Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam);
  • Os ligados à Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene);
  • Programa Alimentação do Trabalhador (PAT)
  • Benefícios da Lei do Bem;
  • Benefício de pesquisa e desenvolvimento;
  • Benefício de apoio à cultura.

Matheus Augusto

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