Agenda ESG: como atrair recursos para projetos de impacto em PMEs
A guinada ESG (sigla para ambiental, social e governança) também tem efeitos colaterais nas pequenas e médias empresas (PMEs).
Dispostas a oferecer produtos e serviços sustentáveis, como parte de um esforço para atender às demandas de consumidores cada vez mais exigentes com seus hábitos de compra, as PMEs passam a investir em inovação, sem deixar de lado o impacto.
Muitas empresas, porém, esbarram na falta de recursos ao apostar nessa transição verde. Um caminho para superar isso está no financiamento sustentável, por meio da captação de recursos para projetos socioambientais.
Na prática, isso significa que uma PME pode se apoiar em projetos e linhas de crédito voltadas a negócios que saibam endereçar questões sociais e ambientais e, em troca, ter capital para colocar de pé projetos próprios.
Esse tipo de financiamento é formado por linhas de crédito subsidiadas pelo governo ou, ainda, pela rede privada.
O propósito é oferecer empréstimos com juros mais baixos e condições de pagamento mais vantajosas para pequenas empresas, em comparação com outras linhas de crédito do mercado.
Juntas, essas linhas cooperam para que essas empresas consigam os recursos necessários para investir em modernização, inovação, tecnologia e aumento de capacidade produtiva.
Por que considerar o impacto?
Segundo Lucas Conrado, líder de relações institucionais do fundo de impacto social para pequenos empreendedores Estímulo, o primeiro passo para atrair subsídios com foco no impacto socioambiental é ter em mente o objetivo com o uso dos recursos.
“Primeiramente, como um diagnóstico do seu modelo de negócio, quais são os impactos que você faz na ponta, se o seu modelo de negócio está estruturado com esse objetivo de impacto, ou se você quer também implementar alguma mudança na sua forma de produzir que pode gerar impacto”, explica.
O principal benefício ao considerar linhas de crédito criadas para essa finalidade está na criação de soluções inovadoras que dificilmente sairiam do papel sem o apoio financeiro externo.
“Ao estruturar projetos, as PMEs podem demonstrar seu potencial de crescimento, atrair financiamento mais competitivo e desenvolver soluções inovadoras”, diz Rafael Brunati, advogado especialista em direito societário, contratos, M&A e Private Equity do escritório Silveiro Advogados.
De acordo com Brunati, há um interesse mútuo das instituições financeiras em fomentar as PMEs – hoje responsáveis por 30% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
Em paralelo, a proximidade com eventos de grande porte, como a COP30 — que será sediada no Brasil em novembro — apenas reforça a importância do tema.
“As empresas precisam aproveitar o momento em que temas ligados à sustentabilidade estão em alta para decidir seus investimentos em. É hora de serem protagonistas”, avalia.
Para além dos benefícios envolvendo as taxas de juros reduzidas e prazos mais extensos, uma das vantagens ao recorrer a programas de financiamento voltados ao impacto socioambiental está na união do capital com a capacitação e apoio aos empreendedores.
“Das iniciativas que conheço, como é o caso dos fundos de impacto, também têm essa atuação de aceleração, e o componente do conhecimento. Em um banco tradicional, não é possível entrar nesse ecossistema de impacto com suporte para além do recurso financeiro”, avalia Conrado.
Apesar dos benefícios, há ainda um desconhecimento geral do mercado sobre a existência dessas linhas mais flexíveis e direcionadas ao impacto socioambiental, o que é um impasse para que um maior número de empresas possam pivotar projetos socioambientais no país.
“Além disso, a ausência de planejamento financeiro e estratégico para o uso desse dinheiro inviabiliza essa alternativa, pois esse uso precisa ser inteligente, de forma que ele viabilize o crescimento e prosperidade da empresa”, diz.
Ele ainda reforça que o portal Investir com Impacto dá uma bom panorama para o empreendedor entender este ecossistema.
Que tipo de projetos podem ser criados?
Entre os exemplos de projetos de impacto que podem ser desenvolvidos por PMEs estão produtos e serviços ou iniciativas que promovam impacto social positivo.
Ações com foco no desenvolvimento social também são exemplos, conforme exemplifica Brunati.
”Observamos um caso recente em que auxiliamos uma instituição financeira captar recursos com outras instituições do exterior para repassar esses valores, em formato de crédito, para micro e pequenas empresas brasileiras, com foco muito grande em empresas lideradas por mulheres e também de locais com IDH abaixo da média”, conta.
Conrado, do Estímulo, destaca também o uso de recursos obtidos via financiamento verde para projetos que impactam o dia a dia operacional de empresas, a exemplo da adoção de energia renovável (como a instalação de painéis solares), eficiência energética e melhoria de processos produtivos.
“Falamos de empresas com produtos ou serviços em linha com a sustentabilidade, mas também pode haver um negócio tradicional que está pensando numa transição energética, redução do consumo energético da fábrica, sistemas avançados de reciclagem, redução no desperdício de alimentos. Há vários caminhos que você pode olhar para impacto dentro do negócio”, afirma.
Como se preparar
Em grande parte dos casos, o financiamento é direcionado a projetos específicos. Para isso, empresas devem preparar um denso documento de apresentação do projeto e suas intenções.
Além disso, no caso de programas voltados exclusivamente para ações ambientais (como no caso de projetos para redução na emissão de gases poluentes ou preservação de florestas nativas) a comprovação do uso dos recursos a longo prazo também pode ser exigida.
Abaixo, os especialistas listam dicas gerais para que empreendedores possam ser mais assertivos durante o pedido de financiamento socioambiental:
Fazer um diagnóstico das finanças empresariais
O primeiro passo é fazer um diagnóstico detalhado da situação financeira da empresa. Considere empréstimos vigentes e dívidas em aberto com outras instituições.
Também é importante avaliar como está o fluxo de caixa e capital de giro do negócio.
“É importante avaliar se a empresa é saudável financeiramente de maneira geral”, diz Brunati.
Desenvolver projetos claros e estruturados
Fazer um projeto que evidencie o destino dos recursos de forma clara e concisa é essencial. Também é preciso que o projeto seja capaz de mostrar para onde vai e como será usado o recurso.
Um calendário de ações pode ajudar na organização.
Tenha uma boa organização de documentos
A apresentação de documentos financeiros da empresa, como balanço patrimonial e fluxo de caixa, é uma etapa comum a todo processo de análise de concessão de crédito.
Ter a documentação em mãos e já auditada pode agilizar e facilitar o processo, principalmente nos casos em que é preciso garantias.
Contratação de uma consultoria especializada
No caso de empresas muito pequenas (e por vezes controladas apenas pelo proprietário), a contratação de uma empresa especializada pode auxiliar no processo de organização de documentos, além de ajudar PMEs a encontrarem programas e linhas de crédito apropriadas ao negócio e seus desafios de expansão.
Onde captar recursos?
Atualmente, o país comporta um conjunto de programas e linhas de financiamento, públicas e privadas, destinadas a empresas de pequeno porte com foco em projetos socioambientais.
Alguns exemplos são o FUNTEC, e linhas do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES).
Além deles, fundos como Yunus, Gaia, Vox Capital e Estímulo já possuem linhas de crédito e apoio educacional para empreendedores à frente de negócios de impacto.
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(Por Maria Clara Dias)