Funcionários da Boeing eram pressionados a priorizar agilidade ante qualidade, diz agência dos EUA
Os trabalhadores da fábrica da Boeing sentiram-se pressionados a priorizar a velocidade de produção em detrimento da qualidade e afirmaram que não receberam treinamento suficiente para realizar adequadamente suas funções, de acordo com os resultados publicados, nesta quarta-feira (25), de uma investigação especial da Administração Federal de Aviação dos EUA (FAA, na sigla em inglês).
Os resultados da auditoria especial de seis semanas da FAA provavelmente aumentarão a pressão sobre uma empresa que já enfrenta uma série de problemas, incluindo questionamentos sobre a segurança de seus aviões e uma greve em andamento de 33 mil trabalhadores sindicalizados, a primeira em 16 anos.
Em janeiro, uma tampa de porta se soltou de um 737 Max operado pela Alaska Airlines logo após a decolagem. Embora ninguém tenha morrido ou ficado gravemente ferido, o incidente gerou inúmeras investigações federais, uma das quais revelou que o avião saiu da fábrica da Boeing sem os quatro parafusos necessários para fixar a tampa da porta.
O relatório desta quarta-feira foi divulgado pelo Subcomitê Permanente de Investigações do Senado dos EUA, que deverá realizar uma audiência com o testemunho esperado do administrador da FAA, Mike Whitaker.
“As descobertas revelam a extensão dos preocupantes problemas de produção, incluindo a luta da Boeing para treinar e equipar adequadamente o pessoal de fabricação, documentar e controlar rigorosamente as peças não conformes, e realizar inspeções de qualidade adequadas”, afirmou o relatório, divulgado aos membros do subcomitê em forma de memorando.
A Boeing disse que está trabalhando para melhorar sua produção a fim de priorizar a segurança e a qualidade.
“Demos passos importantes para fomentar uma cultura de segurança que capacita e incentiva todos os funcionários a expressarem suas opiniões, mas isso exigirá foco contínuo”, disse a empresa em um comunicado.
Whitaker testemunhou anteriormente, em junho, que a FAA adotou uma abordagem “muito negligente” ao regular a gigante da aviação. O novo relatório não poupa a FAA, destacando seu próprio papel nas falhas da Boeing.
“Essas descobertas demonstram uma luta contínua e persistente da FAA para garantir que a Boeing esteja mantendo os mais altos padrões de segurança em suas instalações de fabricação”, acrescentou. “As informações recém-divulgadas levantam dúvidas sobre a eficácia da supervisão da FAA sobre a empresa.”
Em um comunicado nesta quarta-feira, a FAA defendeu sua supervisão sobre a Boeing.
“A FAA continuará com nossa supervisão rigorosa para responsabilizar a Boeing e garantir que a empresa corrija seus problemas sistêmicos de qualidade de produção”, disse a FAA. “O administrador Mike Whitaker deixou claro que ‘não será um retorno ao normal para a Boeing’”.
O relatório documentou casos de falhas de segurança e atalhos rotineiramente adotados pelos funcionários da Boeing. Um dos exemplos mais graves, de acordo com a auditoria, foi um mecânico da Boeing que usou um dispositivo de medição improvisado para verificar folgas entre componentes.
“Esta ferramenta foi feita pelo mecânico, não é autorizada, não calibrada, não marcada, não inventariada ou armazenada”, afirmou o relatório. “O mecânico admitiu usar essa ferramenta por pelo menos três anos. Quando questionado sobre como os outros mecânicos de portas realizam essa medição, ele afirmou que todos fazem o mesmo.”
O relatório também destaca uma “ausência de controle de processo para artigos de sucata”, uma questão levantada por um denunciante em um relatório da CNN no início deste ano.
Durante o depoimento perante o Subcomitê de Aviação da Câmara na terça-feira, Whitaker disse que a FAA inundou a fábrica de 737 da Boeing em Renton, Washington, com seus próprios inspetores, encarregando-os de aprovar individualmente cada novo avião que sai da linha de montagem.
Mas os legisladores têm sido críticos quanto à abordagem da FAA. O senador democrata de Connecticut, Richard Blumenthal, em um depoimento preparado, escreveu que a Administração Federal de Aviação “deve ser proativa e agressiva na supervisão, e não reativa”.
Whitaker disse aos membros da Câmara que a Boeing fez progressos no enfrentamento de trabalhos não resolvidos que “viajam” em novos aviões à medida que avançam pela linha de produção. No entanto, ainda há muito trabalho a ser feito para corrigir a cultura de segurança da Boeing, disse ele.
“Acredito que a mudança na cultura de segurança será um projeto de longo prazo”, disse Whitaker. “Acho que vai levar anos transmitindo essa mensagem de segurança e os funcionários realmente vendo que a segurança é mais importante que a produção antes que essa cultura mude.”